quarta-feira, 25 de abril de 2007

Era assim que gostava de escrever...

Almas Gémeas

«(...)As almas gémeas quase nunca se encontram, mas, quando se encontram, abraçam-se. Naqueles momentos em que alguém diz uma coisa, que nunca ouvimos, mas reconhecemos não sei de onde. E em que mergulhamos sem querer, como se estivéssemos a visitar uma verdade que desconfiávamos existir, de onde desconfiamos ter vindo, mas aonde não tínhamos conseguido voltar. O coração sente-se. A alma pressente-se. O coração anda aos saltos dentro do peito, a soluçar como um doido, tão óbvio que chega a chatear. Mas a alma é uma rocha branca onde estão riscados os sinais indeléveis da nossa existência. (...) Gémea não é igual. É parecida. Não é um espelho. É uma janela. Não é um reflexo. É uma refracção. (...) O desejo de encontrar uma alma gémea não é o desejo de reafirmarmos a unicidade da nossa existência através de outro que é igual a nós. É precisamente o contrário. É pdoer descansar dessa demanda. No fundo, todos nós duvidamos que tenhamos uma alma. Senão não falávamos tanto dela. Uma alma gémea é a prova que não estamos sozinhos. (...) O estado normal de duas almas gémeas é o silêncio. Não é o "não ser preciso falar" - é outra foma de falar, que consiste numa alma descansar na outra. Não é a paz dos amantes nem a cumplicidade muda dos amigos. Não precisa de amor nem de amizade para se entender. As almas acharam-se. Não têm passado. Não se esforçaram. Estão. É essa a maior paz do mundo. Como é que um ninho pode ser ninho doutro ninho? Duas almas gémeas podem ser. Como é que se reconhece a alma gémea? No abraço. (...) Quando duas almas gémeas se abraçam, sente-se o alívio imenso de não ter de viver. Não há necessidade, nem desejo, nem pensamento. A sensação é de sermos uma alma no ar que reencontrou a sua casa, que voltou finalmente ao seu lugar, como se o outro corpo fosse o nosso que perdêramos desde a nascença. (...) As almas gémeas revelam-se uma à outra. Não são iguais. Mas revelam-se de forma igual. Como se tivesse surgido, de repente, uma língua que só os dois conseguissem falar. (...) Toda a angústia do eu se dissipa. É-se inteira e naturalmente aceite. Sem perguntas. Sem condições. Sem promessas. E mergulha-se no outro como se já não fosse preciso existirmos.»
Miguel Esteves Cardoso

3 comentários:

Anónimo disse...

bom livro

Sandra Rodrigues disse...

Gostavas tu e gostava eu ...
Escrever é sempre importante ... nem que seja para nós mesmos, desde que consigamos colocar para fora o que temos cá dentro já é muito bom.

P.s Vi o teu comentário no sorriso aos molhos e confesso que me assustáste ... Pelo nome pensava que eras uma pessoa muito próxima de mim :)

Mas parabéns pelo teu cantinho


beijos

C. disse...

Era assim que eu também gostava de escrever :) !
Tenho-te a dizer que o teu blog é viciante , quanto mais lemos , mais queremos ler :) ! Gostei muito e dou-te os meus parabéns por este espacinho tão bonito .
Beijinho *